I
Andei uns
tempos pensando
No porquê dos animais.
Mesmo que não
haja dúvida,
Perguntar
nunca é demais:
― O que seria
dos bichos
Se não fossem
os vegetais?
Animal tem
atitude,
Animal faz
umas gracinhas,
Faz dengo,
caras e bocas,
Dá medo, nos
faz cosquinha...
Está sempre
na “telona”
E muito mais
na “telinha”.
Animal dá
mais ibope
Nos programas
de TV
Dá movimento
ao cinema
Faz a gente
se entreter.
Mas todo
bicho depende
Das plantas
para viver.
Sem o cacto
no deserto,
Sem o tronco
no cerrado,
Sem a mata a
proteger
Bicho peludo
ou penado,
Nenhum vai
sobreviver:
O nambu fica
pelado,
A araponga
vira um sino
Que diz “tou
to-do... fer-ra-do”
A preguiça é
presa fácil
Urutau é
encontrado
O mico-leão é
presa ―
Saboroso alvo
dourado.
Mesmo estando
em campo aberto
O capim
disfarça bem
O tatu, a
seriema,
Tantos outros
― mais de cem.
No cerrado
até a onça
Tem a cor que
lhe convém.
Milhares de
animais
Usam a
madeira caída
Para botar os
seus ovos
Ou para curar
feridas.
O que
aparenta estar morto,
Vive “assim”,
cheio de vida!
No seu ventre
frio, inerme,
Abriga o
tronco cansado
Insetos,
aranhas, vermes,
E outros
invertebrados...
Vivem também
no seu cerne
O melete
desdentado,
Pica-paus,
serpentes prenhes,
O felino machucado.
Dentro d’água
é a mesma coisa:
Guardam os
galhos encurvados
Cágados,
tucunarés,
Carás,
acaris, pintados,
Sucuris
engravidadas,
Rãs,
jacarés-coroados,
Posturas
feitas com as cores
Com que o
mundo foi criado.
II
Toda planta é
pão, sustento
Dos
invisíveis bichinhos,
Do ratinho e
do leão,
Dos
insetos... Do peixinho
Ao gigante tubarão...
Da avestruz aos passarinhos.
Toda planta é
pão, sustento
De todos, de
alguma forma.
Mesmo o maior
carniceiro:
Quando a
presa, em si, deforma,
Mostra a
origem vegetal...
Isso é lei.
Isso é a norma.
Pois se
planta não servisse
À preá e ao
ratão,
Não haveria
serpentes,
A seriema, o
furão,
Os vários
gatos-do-mato,
O gigante gavião.
E, mesmo a
madeira podre,
É precioso
maná
De milhares
de insetos,
Vermes,
fungos, guruçás
E
micróbios... adubando
O que há por
germinar,
E verdejando
as verduras
Dos lambaris,
da preá.
Não soubesse
o vegetal
Dar sustento
aos lambaris
Não haveria
desovas,
O sauá, o
apaiari,
Um festival
de piranhas,
A traíra e o
surubi.
Sem algas
pros acaris
Os rios
seriam mortos,
Os mares
também seriam
Para tristeza
dos portos.
E, não
havendo poesia,
Os versos
seriam tortos.
Abro aqui grande parêntesis:
Até certos
minerais
Deixariam de
existir:
O carvão de pedra, mais
A turfa e a
rocha grafite
Que do chão
velho se extraem
São fósseis
de antigas plantas
De milhões de
anos atrás.
― Mesmo o ar
que inspiramos
Era muito
diferente
No planeta primitivo
Coberto de
lava quente.
Das primeiras
algas veio
O oxigênio da
gente!
― Muitas
vezes a paisagem
É a obra acabada
De mil anos
de labor
Da matéria
vegetada.
Todo um morro construído
Por plantas
acumuladas!
― Não há
solos se não há
Vida em meio
aos minerais.
E os microsseres dependem
Dos pedaços
vegetais.
Os solos onde
pisamos
Já foram
verdes trigais.
― E certas
plantas, com o tempo
Decalcam um rastro
rosado
No material
das penas
De pernaltas do banhado
Ao comerem
uns caranguejos,
Moluscos avermelhados.
Fica mais
vermelho o íbis,
Fica rosa o
colhereiro,
Ao comerem
esses bichinhos
Pigmentados,
do atoleiro,
Que consomem
algas vermelhas
Desse
hidratado canteiro.
― Antes de
Einstein descobrir
Que energia
dá matéria
Os vegetais
já sabiam
Fazer coisas
bem mais sérias:
Transformar
luz em comida,
Diminuindo a
miséria.
Quando a luz
se fez matéria ―
A glicose
acumulada
Por meio da
fotossíntese
Nas sedes
clorofiladas ―
É que foi
possível ter
O reino da
bicharada.
As plantas
deixam seu rastro
Na comida do
leão
Pois o reles
gás carbônico
Que sai da
respiração
No verdor da
clorofila
Sofre uma
transformação.
E seu átomo
de carbono
Com a energia
solar
Compõe a doce
glicose
Que depois se
ajuntará
Para formar o
amido,
Que outro
produto será.
Ao comer o
vegetal,
Preás, ratos,
ruminantes
Reconstroem,
com o carbono,
Tecidos
energizantes
E os que irão
construir
Fortes corpos
ambulantes.
Por fim, será
do leão,
Via
presas/predadores,
O carbono
transformado
Em carnes de
mil sabores...
Toda energia
e matéria
Para os
consumidores.
Enfim, todo
ser vivente
Deixa um
rastro vegetal:
O carbono é o
tijolo
Da pirâmide vital.
Há um hálito
de planta
No “rei” do
mundo animal
Que devolve
para o mundo
Seu carbono
corporal
Quando,
satisfeito, expira,
E no suspiro
final.
― Ah, se
planta não soubesse
Transformar a
luz solar
O vasto Reino
Animal
Deixaria de
se fartar...
― Nem sequer
papel teria
Pra estes
versos eu botar.
E para
finalizar
O parêntesis
sonífero,
É bom lembrar
que “animal”
Não é só
“grande mamífero”:
O reino
inclui uns milhões
De microsseres
prolíferos.)
III
Retomando o
trilho, rumo
À questão
inicial,
É preciso uma
resposta
Para se ter o
final.
Mas não há
fim nessa história:
Não há
tristeza nem glória,
Pois não há Reino Animal,
Nem Monera,
nem Protista,
Nem os reinos
Fungi ou Plantae:
As bactérias
adoram
A fresca
sombra das plantas.
Para os
fungos, os vegetais ―
E, também, os
animais ―
São seu
almoço, sua janta.
E os arteiros
animais?
Nem é preciso
dizer!
As plantas
precisam deles
E eles não
sabem viver
Sem esse
verde cheirinho,
Esse rico
temperinho,
Esse eterno
florescer.
IV
Ninguém é rei
de ninguém!
Há de findar
os reinados.
Dá uma flor
pra mim, tem dó
Desse poeta
enrolado!
Dá em forma
de sorriso
(Esse carinho
preciso)
― Pra que eu
me sinta agraciado neste verso
[de pé
quebrado.
Paulo
Robson de Souza